REALISMO

Características do realismo

Impessoalidade, apagamento das ideias do autor.

Fim das idealizações: retratos de adultério, miséria e fracasso social.

Frequentes críticas às hipocrisias da moralidade da nova classe dominante, a burguesia.

Esteticismo: linguagem culta e estilizada, escrita com proporção e elegância.

Abordagem psicológica das personagens como composição da realidade que veem.

Valorização da objetividade e dos fatos.

Subtópico

Contexto histórico do realismo

Madame Bovary, romance de Gustave Flaubert, publicado em 1857, é considerado pela crítica literária a obra inaugural do movimento realista. Nesse ano, morria Auguste Comte, fundador da filosofia positivista, a essa altura bastante popular na Europa.

O positivismo comteano teve grande influência nas obras do realismo e no pensamento da época de modo geral: tratava-se de uma concepção de mundo científica, que propunha que a apreensão da realidade deveria ser objetiva, empírica, como nos procedimentos de análise das ciências naturais. O progresso, ideal maior dos positivistas, só viria por meio da ciência.

Foi nessa época que Charles Darwin publicou seu livro A origem das espécies (1859), cuja teoria evolucionista influenciou diversas áreas do saber, incluindo a literatura. A ideia de que os seres vivos passam por um processo de seleção natural, que determina as espécies que sobrevivem e as que são extintas, estendeu-se para a dimensão das relações humanas: é o chamado darwinismo social.

Essa concepção hierarquiza as sociedades, identificando os europeus como superiores intelectualmente graças ao desenvolvimento tecnológico e cultural, ao contrário de outras sociedades, como os povos ameríndios e do continente africano, reforçando, com um teor “científico”, a noção de “primitivo” e “civilizado” que já existia na mentalidade eurocêntrica há muitos séculos.

Outra teoria em voga na época era o determinismo científico, que entendia que o comportamento humano é determinado pelas condições do meio, outro pensamento preconceituoso à serviço da estratificação social.
Filhos de seu tempo, os realistas abraçaram a ciência como grande patrona do século XIX, substituindo as idealizações e anseios de liberdade do romantismo por uma postura analítico científica, dissecando a realidade que se via em constante transformação.

O realismo, movimento estético predominante no mundo ocidental no último quartel do século XIX, surgiu como uma onda de oposição à subjetividade e ao individualismo da tendência artística anterior, o romantismo.

Realismo no Brasil

Enquanto o movimento europeu era norteado pelas mudanças do avanço industrial, que já alçava sua segunda etapa, o Brasil, por sua vez, iniciava um lento processo de modernização, atravancado pelo ranço colonial que se mantinha na política do Segundo Reinado e na manutenção da mão de obra escrava. Em sua maioria, os escritores realistas brasileiros foram republicanos e abolicionistas, não raro abordando em suas obras esses ideais.

Realismo brasileiro tem início com os círculos literários nordestinos: primeiramente em Fortaleza (CE), com os grupos Fênix Estudantil (1870), Academia Francesa (1872) e Padaria Espiritual (1892), que geraram autores célebres como Capistrano de Abreu, Rodolfo Teófilo, Paula Nei, entre outros. Também nos anos de 1870 surge a chamada Escola do Recife, movimento intelectual pernambucano liderado por Tobias Barreto e Sílvio Romero, grandes influenciadores do pensamento realista nacional.

Os três principais nomes do realismo brasileiro são o maranhense Aluísio Azevedo, o carioca Machado de Assis e o angrense Raul Pompeia. Se quiser aprofundar-se nesse tema, acesse: Realismo no Brasil.

Machado de Assis

Machado de Assis, por sua vez, é aclamado como o maior escritor brasileiro de todos os tempos, principalmente pela riqueza com que explora as técnicas narrativas e pelo retrato apurado da psique humana. Autor de romances, contos, crônicas, peças de teatro e textos de crítica literária e teatral, além de poesias, sua prosa realista, que lhe rendeu o posto de glória na literatura brasileira, passou a ser produzida a partir de 1870.

Em linguagem direta, mas elaborada, as obras machadianas conduzem à reflexão a partir de cenas do cotidiano. Não é a história que se apresenta como novidade, mas o modo de narrar. Geralmente os personagens e situações são banais, mas a maneira como Machado relata-os é que traz consigo a novidade genial: trata-se de um realismo que leva em consideração a condição psicológica das personagens enquanto modo como elas apreendem a realidade.

Desse modo, a realidade, matéria-prima da estética realista, não é feita apenas de fatos, mas de como as pessoas percebem esses fatos. Assim, a narrativa machadiana é repleta de interferências, fluxos de pensamento, memórias, digressões de todos os tipos, o que aproxima a prosa da maneira como a mente de fato funciona.

Machado também é dono de um humor peculiar e de uma ironia sutil, presentes em boa parte de sua obra, dando a situações críticas uma certa leveza, e faz uso frequente da metalinguagem, ou seja, refere-se à elaboração do livro no próprio livro.

Realismo na Europa

O Realismo teve início na Europa, mais especificamente na França, como resposta ao artificialismo do Neoclassicismo e ao sentimentalismo exacerbado do Romantismo, em um momento conturbado da história do continente, repleto de revoltas sociais e de insatisfação política que foram traduzidas para a sua literatura.

Nascido na França, herdeiro dos romances de Balzac e Stendhal, o realismo consolidou-se como movimento literário a partir da obra de Gustave Flaubert. Flaubert é considerado o pai do realismo. Sua Madame Bovary (1857) foi um escândalo à época, pois centrava o enredo em Emma, uma moça sonhadora que esperava encontrar no matrimônio a grande realização de sua vida, mas, ao desposar Charles Bovary, desencanta-se rapidamente com o casamento e com a mediocridade do rapaz, um jovem cirurgião sem talentos e de mentalidade obtusa.
As longas descrições de Flaubert, muito pormenorizadas e em linguagem trabalhada com excepcional afinco, revelam então Emma em busca de algo que a interesse, o que a leva a jogos de sedução e ao adultério. Trata-se de uma dessacralização do casamento enquanto encontro de almas do amor romântico.

Em Portugal, entende-se que o movimento tem início em 1865, com a Questão Coimbrã, que começa com um prefácio do romântico Feliciano de Castilho criticando avidamente a nova tendência literária que aparecia na poesia de Antero de Quental. Para ele, a nova geração carecia de bom senso e de bom gosto.
Antero de Quental, por sua vez, respondeu-lhe em uma carta aberta, em defesa da liberdade de expressão e de existência da nova escola. Castilho não respondeu; Ramalho Ortigão tomou suas dores, e a história acabou em um duelo, vencido por Antero de Quental (que mal sabia segurar um florete). A Questão Coimbrã apareceu em páginas e páginas da imprensa portuguesa, funcionando como um divisor de águas da literatura, pois o realismo tornou-se também a tendência estética vencedora a partir de então.

O principal romancista do realismo português foi Eça de Queirós, que além de escritor era diplomata, tendo viajado para diversos lugares, como Cuba, Egito e América do Norte. Sua obra pode ser dividida em três fases: uma de preparação, composta majoritariamente por produções veiculadas na imprensa (1866-1867) e alguns textos ainda de cunho romântico; uma de realismo agudo, quando escreve os grandes romances críticos O crime do padre Amaro (1875/1876/1880), O primo Basílio (1878) e Os Maias (1888); e uma de maturidade, caracterizada por um humanismo saudosista, época em que publica A ilustre casa de Ramires (1900) e A cidade e as serras (1901).

A principal característica de Eça de Queirós é seu trabalho com a linguagem. “Sobre a nudez forte da verdade, o manto diáfano da fantasia” é uma de suas célebres frases, e reflete o esmero com que se dedicou à estilização de sua prosa. Os cenários vulgares ou muitas vezes degradantes do realismo são trazidos à tona por meio de uma descrição luminosa, rítmica, feita com esmero.

A ciência e as teorias sociais

Karl Marx foi um pensador alemão que morou na França e na Inglaterra, onde pôde acompanhar as mudanças da Revolução Industrial e a situação dos operários. Publicou, juntamente com Friedrich Engels, “O Manifesto Comunista” e “O Capital”, obras importantes sobre o socialismo. O socialismo visa à propriedade coletiva dos meios de produção e ao fim da propriedade privada, o que, no entendimento dos autores, eram os fatores responsáveis pelas desigualdades sociais, onde poucas pessoas enriqueciam às custas das camadas de operários. Marx também acreditava que a história e as mudanças sociais eram fruto das forças econômicas da sociedade, não do acaso ou simplesmente do “poder das ideias”. Esse modo de interpretação da história recebeu o nome de materialismo histórico e mudou alguns paradigmas de compreensão não apenas da história, mas também de disciplinas como economia e geografia.

Com as mudanças trazidas pela Revolução Francesa e pela Revolução Industrial, o pensamento científico também estava transformando a Europa.
A necessidade de conhecer mais sobre o mundo natural fez com que, progressivamente, as explicações religiosas fossem substituídas pelos estudos sistemáticos e objetivos. No entanto, esse modelo de estudo não ficou restrito ao mundo físico, sendo extendido também às chamadas “ciências sociais”, na tentativa de estudar as sociedades de modo científico.

Aluísio Azevedo

Aluísio Azevedo, contudo, diferencia-se dos outros dois por sua estética de tendência naturalista. Corrente literária fundada pelo francês Émile Zola, que, embora se assemelhe ao realismo e intente uma visão objetiva da realidade, tem características próprias: no Naturalismo prevalecem as descrições animalescas da personalidade humana, a abordagem patológica das personagens, a ênfase nos instintos, perversões e comportamentos sexuais, bem como a explicação dos fatos apoiada no determinismo científico. É o caso das obras Casa de pensão (1883) e O cortiço (1890), célebres produções de Azevedo.

Raul Pompéia

Outro é o universo de Raul Pompeia, autor que morreu prematuramente, deixando poucas obras em vida. Seu romance mais aclamado, O Ateneu (1888), escrito em primeira pessoa, versa sobre as memórias de Sérgio, que recorda o período adolescente em que esteve no colégio interno. Já adulto, o narrador-personagem vê-se confuso e rebela-se pela incapacidade de modificar o passado, ou de reagir de outra forma.
O universo opressor do colégio mostra a Sérgio uma infinidade de novas existências, desconhecidas de sua vivência doméstica — cada personagem é um tipo social, uma caricatura, desde o diretor Aristarco, cujo interesse único é o lucro, até Franco, menino esquecido pelos pais, que não pagavam o colégio, fazendo com que sofresse perseguições de alunos e mestres.
As técnicas narrativas de Pompeia aproximam a forma do texto da forma mesma da lembrança: esfumaçada, incerta, interrompida, ao mesmo tempo que a linguagem também é muito expressiva; alguns críticos consideram haver traços do impressionismo e do expressionismo na obra. No entanto talvez a grande novidade seja a presença da homo afetividade nas novas relações que a vida no colégio desdobra, temática que aparece diversas vezes ao longo do romance, revelando uma prática socialmente ignorada e propositalmente encoberta: a das relações homossexuais entre rapazes em regime de internato.